quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Azul e Onde está o Cinema?


(Para primeira e última aula de análise fílmica e história de Cinema- Oficina Oswald de Andrade)

Sem muito querer poematizar, preciso falar de Cinema.

Onde está o Cinema?
Nem adianta me responder que no shopping tem um cinemark.  Tô falando de Cinema, A Arte.
Hoje na última aula na Oswald de Andrade, Falamos de Teoria de Cinema e fui feliz em saber o Cinema dos homens da caverna. O filme é “Bisão Observador”, Lhe adianto a sinopse: “Arqueólogo adentra caverna e bisão  observa todos seus passos, depois corre.” Cinema 4D, gente! Incrível. Imagina é o espectador participando do filme não somente se projetando na história, mas é parte dela. (Nós que nos projetamos nos personagens ou eles que já foram feitos para serem projetados em nós?)
Aula de teoria. Usa-se muito “ismo”. Coisa que detesto, mas fazer o quê se a humanidade precisou arquivar tudo, fazer relatório. Exemplo: neo-realismo e etc...
Se há tanto “ismo”, Me pergunto Onde está o Cinema? Em que “ismo” ele se encontra?
O que os estudantes vão estudar daqui a alguns anos?
Cinema do Pobrismo, Pequenismo, Desaparecismo.
Cadê o Cinema?
Me doeu particularmente ouvir do célebre Sylvio, que cinema é uma arte em extinção...Por isso quero saber onde está o Cinema e o que fazer com ele. Quero ver se tem jeito. 

AZUL
Por volta dos meus seis anos de idade, Eu não sei por que cargas d’água, eu achava que tinha inventado o céu, Levantava todo dia cedo e ia pra enorme janela da minha antiga casa e ‘brisava’ olhando minha obra. Eu não contava para ninguém, aliás, eu não era muito de falar. Eis que um belo dia meu pai destruiu minha vida, Quando eu passava pela sala, ouvi ele reclamar com a TV: “De novo esse filme velho, já tem uns 200 anos”. Olhei pra TV e vi um belo plano do céu e pensei: “ué, se esse filme tem duzentos anos, como eu inventei o céu? Esse filme inventou primeiro. Pois então vou fazer filme e inventar coisas.”
Não exatamente com essas palavras, Não sei também se foi aí que nasceu a vontade de Cinema em mim, Há outras histórias. Mas o céu é azul.
Na minha primeira aula na Oswald, Truffaut parecia fazer alguma relação de Cinema com Azul.
Numa outra célebre aula (sempre o mesmo adjetivo) da Oswald, Humberto Mauro disse “Cinema é cachoeira”
Um pouco antes dessa aula, Monica Nador em sua exposição na Pinacoteca, comenta sobre um artista que contava uma técnica para pintar cachoeiras, linhas para baixo e azuis.
Ao mesmo tempo, Na aula de Computação Gráfica, I.C.  O professor ao falar de arte egípcia,nos conta que eles usavam bastante a pedra lápis-lazúli .Preciosa e raríssima.
E azul.
Sem mais delongas. Cinema há de ser azul e deve ser lápis-lazúli, Precioso e raro.
Será que teremos que garimpar cinema?
Matar, morrer e traficar cinema?
Cinema, além de caro, que já é,Raro também não dá.
Célebres entusiastas do Cinema (como eu) vamos, por favor, amá-lo e preservá-lo.
Fazer Cinema de verdade.
Cinema azul claro- tipo Truffaut ou azul escuro- tipo Godard, azul bebê- curta metragem ou azul marinho- documentário.
Há muitos azuis, Há muitos cinemaS, Vamos cinemar, Vamos reverberar.
Vamos pintar o mundo.
De azul.

Bruna Therolly
 15/12/2010


O ANJO EXTERMINADOR por Bruna Therolly


 O ANJO EXTERMINADOR- LUIS BUÑUEL
Buñuel por Dalí...

Sinopse:  Depois de uma festa, os convidados simplesmente não conseguem deixar o local, sem que haja uma explicação racional para isso. Conforme o tempo passa, as máscaras dos antes bem relacionados começam a cair e revelar suas verdadeiras e mais profundas facetas.
cineplayers.com

INÍCIO
Começo com a sinopse para poder partir daqui. Pois se me perguntassem como é o filme ou o que é. Eu diria que é o filme que É. Simplesmente é.
Nas discussões com os célebres colegas da aula de história de cinema na Oswald de Andrade, Falou- se bastante do contexto histórico do filme, e eu preferi  ouvi-los, pois parecia que nem vimos o mesmo filme, tamanha a subjetividade que ele oferece. E parece ser claro demais, já por este motivo de contexto, mas não nos convence de que se é apenas isto. Felizmente alguém disse que se o filme de Buñuel era apenas uma crítica a sociedade, era pobre demais. Talvez daí o não convencimento de o filme tratar- se somente de uma crítica a sociedade burguesa.

SENSAÇÕES
Tive três fases de sensações com o filme.
Antes, Durante e Depois.
O ANTES se mostrou durante o filme, tudo o que eu acreditava ,estava ali roteirizado, decupado e filmado.
DURANTE- Tive vontade de cutucar alguém ao lado e dizer “Isso é tudo o que se há”
Não só as mazelas sociais, não só o experimento de abaixar a burguesia, não só os sentimentos de prazeres, nem isso tudo em cada lugar. É o cerne de tudo isso em um ponto só.
É o que tem na linha tênue entre o ar e os vãos, é a própria linha.
 “Há mais mistérios no mundo do que supõe a vã filosofia”- O filme é todo esse mais e toda suposição da vã filosofia.
DEPOIS- Tive uma conversa com os célebres professores, falando de outro filme. E por causa deste filme, fiquei  reverberando algumas coisas que queriam fazer sentido e não achava espaço. Mas depois de ver o filme e ele ativar essa minha sensibilidade ao “inconsciente ativo”  Me lembrei de algo, que sempre passeava pela minha memória como algo trivial.

O BICHO
O bicho em frente ao vidro.
Eu era ele o tempo todo!
Explico: Numa viagem, a Minas Gerais, de ônibus, eu com 12 anos, percebia  ao meu lado, na janela, um bicho (que não sei o nome,parecia uma baratinha) que ora voava ,ora andava pelo vidro da janela do ônibus. Andou ao meu lado e do lado da janela, talvez numa manobra para voar, parou em frente ao seu próprio reflexo no vidro. Parou. As anteninhas balançavam, mas permaneceu lá, a viagem toda, parecia não conseguir sair dali. Lembro-me de achar graça, e volta e meia, certificar se ainda estava lá e também me perguntar por que é que não saía de frente do vidro. Falei disso algumas vezes, em assuntos de fatos inacreditáveis, bicho com atos aparentemente racionais.
O bicho era eu.
O filme de Bunuel era eu.
Se o filme é (como eu disse )e eu sou. O filme sou eu.  Represento aqui o ser, não quero parecer detentora  da magnificência de Buñuel, Você, que sou eu, também é o filme e o bicho do vidro.
Por que o filme É?
Porque é tudo que há, não sei se no mundo, pois mundo é pequeno demais, talvez Universo. (que também é pequeno, mas a palavra é maior)
Antes de ver o contexto Histórico e a crítica social, Vi o desejo.

DESEJO
O professor havia dito algo sobre o que era desejo para Buñuel, algo que não prestei muita atenção e por isso, esquecido. Porém, O “formato” do enredo me pareceu uma alegoria deste sentimento. O desejo por algo impossível de se alcançar. Eu abracei esta hipótese, por esta leve lembrança e pelas dicas no filme.  Posso até ousar a fazer um paralelo.
No começo é confortável, sedutor (boa música, boa bebida, pessoas). Depois divertido, excitante(Acordam, acham divertido tal situação) Depois estranho (incômodos), Depois insuportável(perda das boas maneiras), Depois desespero (fome,sede) Depois como solução quer- se voltar ao que se era, para daí não se entregar. E desejo é fome, é sede. Sacrifica-se pelo desejo. Um personagem dá esta fala: “Parece que sempre estivemos aqui e sempre estaremos, a menos que fujamos você e eu”. Se desejo suporta-se , parece estar habituado a ele e ter a capacidade de  sempre estar, a menos que se fuja, os dois. Pois  se o desejo por algo impossível é impedido por algo, longe deste algo, é Livre. E deixa de ser desejo, se consumado.

ESPERANÇA
Portanto desejo se parece com esperança, esta, bem nítida no filme.
E esperança, o pior dos males, é inútil. É como “Fiado, só amanhã” A esperança acomoda e talvez seja um pilar que justifique  o contexto histórico do filme. Acomodaram-se na esperança e ficaram vítimas de um sistema de ditadura, onde quem esta fora deste sistema, sabia-se “melhor”. E se a partir daí, quiser experimentar  a burguesia despir-se de todo seu bom senso,sua ética,seus valores, trabalharem só com instinto,se igualarem ao proletariado, (pois não há condições de ser civilizados em tal situação)Aí , é que parece que Buñuel gostou ou quis chegar. 

SONHO
Depois que só o instinto está em voga, O que há?  Depois e não durante, pois durante nós vemos no filme, (mata-se e “morra-se”) Suponho que seja aqui, que está a graça e o não- convencimento que esta obra trata-se pura e simplesmente de uma crítica social, pois se surrealismo, a pintura, baseava-se nos sonhos, no que parecia não fazer sentido, parece que depois do instinto é só o chamado “inconsciente” que trabalha, O inconsciente é desprovido de ética, valores ou bom senso e é LIVRE, Vaga por onde quer, é uma mão solta, sem membros, apalpa o que quiser. O ilógico é lógico. É porque é.
 Os sonhos (de dormir) loucos dos surrealistas, os sonhos loucos que temos somos nós mesmos, não se sonha para o outro.
E se quando está sonhando, sou uma mão sem membros apalpando qualquer imagem registrada em minha memória (ato que pode ser interrompido por algo externo, uma facada entre os dedos ou gritos, por exemplo.) a liberdade do inconsciente, do ilógico faz o sentido da nossa alma, do ser. O inconsciente que detectamos/ reconhecemos, somos nós mesmos.
Talvez eu esteja dizendo que o filme é tudo isso que disse, Pois me vi nele, e talvez não possa fazer nenhum sentido para você, que seu inconsciente ativo reconhece-se em outras coisas, Mas todos partimos da mesma essência de SER.
Eu SOU.
O bicho É.
O bicho SOU eu.
O filme SOU eu.
Tudo o que Há, É.
O filme É.




Marvada Carne- André Klotzel

" O melhor de ver filmes,quando você não está realizando-o é roubar umas idéias de planos, (Por exemplo,camêra no chão e personagem pulá-la, em situação de triunfo). Simples, mas adequado. Aliás Simples deve ser a palavra que rege o filme Marvada Carne de André Klotzel, que resulta em mim a vontade de chegar mais no âmago brasileiro, a  simplicidade desses habitantes, simplicidade esta, que significo ser a ausência de ambições consideradas grandes, Se eu chegar mais neste âmago e me aprofundar mais, Encontro o que todo mundo é , uma lei universal, o desejo de ser feliz. Óbvio isso, Eu sei. Mas não é bonito como tudo o que é universal não deixa de ser, mas se compõe em outra roupagem? O enredo trata-se de  Nhô Quim,um homem do interior de São Paulo, Contando um "causo" a sua família sobre o desejo de comer carne de boi e como isso o ocupou em momentos de sua vida. Ou seja, O desejo de ser feliz caracterizado em cada povo, cada contexto histórico, costumes tradicionais, Em Marvada Carne é captado o melhor do Brasil, com a singularidade que temos, o povo do interior e suas faces, crendices populares, curupira, contação de causos  como nariz colado ao contrário, além de mutirão para construção de casebres, a fé ingênua e bem representada por Fernanda Torres em Carula, que sonha em se casar e não larga do pé de Santo Antônio que é vítima de suas reações e até se manifesta de vez em quando. Não só essa fé, mas negociações com Diabo e muito mais.
Marvarda Carne é um belíssimo filme para ser visto. 
Nossas retinas cinematográficas fazem as pazes com o belo Brasil representado."
blog:brunatherolly.blogspot.com

domingo, 19 de dezembro de 2010

Garrincha, alegria do povo.

por Marlon Marques.























Garrincha não foi melhor jogador que Pelé. Mas Garrincha com certeza é o mais brasileiro de todos os nossos craques. Dentre todos os saídos de favelas, oriundos das classes mais baixas, dos descamisados e descalços – nenhum se compara quanto ao “brasilismo” a Garrincha. As imagens do documentário “Garrincha, alegria do povo” (Joaquim Pedro de Andrade, 1962) – trazem ao espectador a condição lírica do craque em campo. Garrincha nascido Manoel, logo tornou-se pela informalidade brasileira Mané, tal qual Luis, torna-se Lula. “Mané” é o mesmo que bobo, e bobo chamamos “João” – nome pelo qual Garrincha chamava qualquer de seus marcadores e adversários – do beque de jogo de fim de ano de empresa à um Nilton Santos ou Luis Pereira. Garricha é assim tão brasileiro porque leva a vida no improviso, tal qual todo brasileiro – sem eira nem beira, planejamento ou preocupação. Essa característica diferencia-nos do futebol científico e burocrático da Europa, deu-nos uma cara, e essa cara é toda ela Garrincha. “Garrincha nunca precisou pensar. Garrincha não pensa. Tudo nele se resolve pelo instinto, pelo jato puro do instinto”[1] – o que o brasileiro faz quando o mês é mais longo do que o dinheiro? Inventa algo. Tira do bolso alguma saída mirabolante, e Garrincha faz o mesmo para penetrar zagas como paredões intransponíveis (veja a gama de dribles durante o documentário). Garrincha não humilha os adversários pela soberba ou pelo regozijo, mas sim pelo instinto – a humilhação não é a meta, sim a conseqüência. O faz como late o cachorro. Mané vê a todos com igualdade de um “joão” – com a pureza de um eterno menino – a isso o historiador Sérgio Buarque de Holanda chamou de “homem cordial”. Garrincha morreu na pobreza, mas ainda sorridente – com o mesmo sorriso do auge de seu esplendor (o momento que trata o documentário), e nisso ele também se transforma em espelho do Brasil, humilde, pacato, cativo a sua condição e pobre. Entretanto precisa apenas de um Botafogo versus Flamengo para Mané compensar a todos os brasileiros de suas humilhações pessoais e coletivas.[2] Sim, o brasileiro precisa de pouco para ser feliz (que é muito), apenas de diversão, de magia, de dribles e fintas – seja num mundo imenso de fantasias ou num trecho qualquer do campo, já que “para um drible de Garrincha, a superfície de um lenço era um latifúndio”[3]. O filme é documentalmente muito bem pesquisado, intercalando diversos momentos do craque – captando-o do final dos anos 50 até a o início dos anos 60, no auge de sua carreira que culminaria com a conquista hercúlea da Copa do Mundo do Chile no ano do documentário, 1962. A astúcia principal do diretor é o jogo que ele faz entre fotos e vídeo – há uma cena em que Mané para na frente de um de seus “joões” antes do drible, o diretor então aproxima em fotografia o rosto atento do marcador, tentando em vão nos passar (o marcador, não o diretor) concentração, como se isso fosse resolver. Lance seguinte: quedas e rodopios no próprio eixo, pois como disse Armando Nogueira, o mistério de Garrincha apenas Deus sabe decifrar, nós (incluindo seus marcadores) meros humanos apenas ficamos imóveis ante ao gênio[4]. O povo se igualava para ver o espetáculo Garrincha. O cronista Mário Filho disse certa vez que “diante de Garrincha, ninguém era mais torcedor de A ou de B. O público passava a ver e sentir apenas a jogada mágica. Era, digamos assim, um deleite puramente estético da torcida”[5]. Garrincha não fazia o espetáculo pelo dinheiro ou pela fama, o fazia pelo amor. O brasileiro é muito mais coração do que razão, e nisso mais uma vez ele nos representa, nos totaliza. Quantas foram às infiltrações recebidas nos joelhos? Quantas vezes não jogou aquém de suas condições? – quantos brasileiros também não vão as fábricas e roças darem seu sangue sem condições dignas? Garrincha é o Brasil, a alegria do povo, pois com ele e apenas com ele, o brasileiro se sentia alguém e algo de valor. O que o moço humilde da arquibancada – branco ou negro, via em campo, era algo familiar, algo próximo de sua condição. Garrincha nasceu imperfeito, feio, desbotado, torto, fora dos padrões “franceses” e “burgueses” da época. Em cada um de nós há um pouco de Garrincha – da zombeteira ginga do dia-a-dia, do levar as coisas na “esportiva” nas relações pessoais, na informalidade, na cordialidade, no improviso. Isso tudo torna Garrincha o mais brasileiro de todos os nossos craques – pois “em 62 o mais indigente dos brasileiros pode tecer a sua fantasia de onipotência, e por tudo isso, as multidões sem que ninguém pedisse, sem que ninguém lembrasse, as massas derrubaram os portões e ofereceram a Mané Garrincha uma festa de amor como não houve igual nunca”[6]. O documentário embora mostre o Mané apenas em campo, dá aqueles com sensibilidade mais apurada, a dimensão exata do craque e do jogo. Aquilo não são apenas imagens de um jogo, aquilo é a própria vida. Aquele não é apenas um homem trabalhando, sim um anjo torto a brincar com seu brinquedo (a bola), enganando, rodopiando, girando, fazendo diabruras como um Saci-pererê, um Curupira. O Curupira e o Saci tal qual Garrincha são seres fantásticos, imagéticos, fabulosos e dotados de pequenos defeitos que os tornam acima dos demais. As pernas tortas que a princípio trariam ao menino desvantagem, logo tornaram-se hábeis ferramentas de seu ofício, veja a semelhança apontada por José Miguel Wisnik: “O curupira [...] distingue-se por um traço físico peculiar: seus pés são virados para trás – quando o curupira corre numa direção, suas pegadas correm na direção contrária. O curupira é veloz e enganador”[7]. Não temos o heroísmo grego, a perfeição dos seus deuses, temos um folclore maldito, imperfeito – com seres da noite, e nosso Mané, repito, é como nós, imperfeitos, pobres, feios. E como qualquer um de nós, era cheio de dúvidas, medos, desejos, sonhos – para ele não havia diferença entre o Olaria e a seleção Tcheca, não havia diferença entre caçar passarinhos e ganhar um título mundial, ou entre a mão suja do balconista que lhe dava uma dose qualquer e a mão alva do príncipe da Suécia – Garrincha nos torna mais humanos. E entre as certezas, alegrias e incertezas, Mané também via (como muitos brasileiros) na bebida (e no jogo, noutra dimensão) uma fuga de sua dura realidade: “eu bebo e vocês me internam. Eu saio, bebo de novo e vocês me internam de novo. Por que vocês querem que eu volte pra merda da minha vida”[8]. Garrincha é com certeza o Charlie Chaplin do futebol, o eterno cômico, aquele que nos revigora, que enche nossas almas de plenitude e nos salva na dimensão da eternidade. Garrincha o mais brasileiro de todos os jogadores, o mais humano dos imperfeitos, e o mais perfeito entre os imperfeitos.



[1] RODRIGUES, Nelson. À sombra das chuteiras imortais. São Paulo: Cia. das Letras, 1993. p. 63.

[2] RODRIGUES, Nelson. Idem. p. 120.

[3] NOGUEIRA, Armando. O canto dos meus amores. Rio de Janeiro: Ed. Dunya, 1998. p. 11.

[4] NOGUEIRA, Armando. Idem. p. 13.

[5] RODRIGUES, Nelson. Idem. p. 63.

[6] RODRIGUES, Nelson. Idem. p120.

[7] WISNIK, José Miguel. Veneno remédio: o futebol e o Brasil. São Paulo: Cia. das Letras, 2008. p.276.

[8] CASTRO, Ruy. Estrela solitária – um brasileiro chamado Garrincha. São Paulo: Cia. das Letras, 1995. p.483.


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quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Garrincha, Alegria do Povo por Bárbara Borges

Garrincha, um herói sem nenhum caráter

"O documentário de Joaquim Pedro de Andrade consegue transmitir a emoção que o futebol causa no povo brasileiro. Como personagem principal está Garrincha, o gênio indomável da bola que, com suas pernas tortas, quando entra em campo assume toda a sua divindade e faz o Brasil parar. Com toda sua bravura, malícia e autoridade, Garrincha marcou uma época em que futebol era pura alegria ou tristeza. E nada mais."
Eny de Oliveira, 8/12/2010

Alegria. Tristeza. Emoção. Futebol. Gênio. Bravura. Autoridade. Malícia. Inocência. Brasil. Isso é Garrincha. Isso é futebol. Em Garrincha, alegria do povo (1962), o cineasta Joaquim Pedro de Andrade (1932-1988) intensifica, com fotos, as emoções desencadeadas pelo futebol nos torcedores, em um período em que contratos milionários entre jogadores e grandes clubes estavam longe de acontecer e o que valia de fato era a beleza com que eram feitas as jogadas.

Para falar de futebol, o diretor apropria-se da figura de Manuel Francisco dos Santos (1933-1983), o Mané Garrincha, um jogador bem acima do normal, elogiado pelo grande público que o vê como sendo quase um herói. Mas ele é um herói contraditório: apesar de salvar o futebol da mediocridade, é um herói alcoólatra, é um herói com tendência a engordar, é um herói que está sempre cansado, é um herói que não gosta de trabalhar... Ai, que preguiça!

Divindade do futebol? Ricos e pobres, nobres e plebeus, políticos da situação e da oposição: em procissão, todos procuram por Garrincha. Mas que Garrincha? Garrincha tem muitas faces. Se em seu olimpo, o campo de futebol, parece ser um deus, fora das quatro linhas nada mais é do que o mortal Manuel, aquele menino pobre que, quando nasceu, ouviu de um anjo torto: “Vai, Mané, vai ser gauche na vida”. E parece que entendeu tão bem que até com pernas tortas chegou ao mundo!

Garrincha, alegria do povo
(1962)

Direção: Joaquim Pedro de Andrade
Roteiro: Luiz Carlos Barreto, Armando Nogueira, Mário Carneiro, Joaquim Pedro de Andrade, David Neves
Gênero: documentário
Origem: Brasil
Duração: 60 minutos
Para saber mais
ANDRADE, Carlos Drummond de. Quando é dia de futebol. Rio de Janeiro: Record, 2002.
BARTHOLO, Tiago Lisboa; SOARES, Antônio Jorge Gonçalves. Mané Garrincha como síntese da identidade do futebol brasileiro. Movimento, Porto Alegre, v. 15, n. 1, p. 169-191, jan.-mar. 2009.
RODRIGUES, Nelson. À sombra das chuteiras imortais: crônicas de futebol. Seleção e notas de Ruy Castro. São Paulo: Companhia das Letras, 1993. [Veja vídeo de 1995 produzido pelo Canal 100]

Garrincha, Alegria do Povo por Edgar Bueno e Gustavo Camargo


"O filme documentário de Joaquim Pedro de Andrade, (1962), primeiro documentário brasileiro sobre um esportista e que ganhou o Prêmio Carlos Alberto Chieza, no Festival de Cortina D'Ampezzo, Itália 64, trata mais do futebol como um todo, das sensações e emoções que ele provoca nas pessoas, do que de um personagem em si, o gênio Garrincha.

Trata da pessoa, do menino simples de pernas tortas que adorava jogar bola. Não mistifica nem idolatra, pelo contrário mostra o lado humano e familiar, mostrando as origens e raízes de Garrincha do Botafogo e da Seleção Brasileira. Porém, de forma sutil, o autor deixa clara a importância que esse jogador teve em sua sua época, mostrando uma foto dele ao lado de Getúlio Vargas, então presidente do Brasil. Algo inimaginável para uma pessoa simples, um mau operário, nascido em Pau Grande, distrito de Magé (RJ).

Aproveitando-se de imagens produzidas pelos meios de comunicação, bem como as realizadas por cinegrafistas amadores, fragmentos da realidade são especialmente escolhidos, mostrando “closes” de anônimos, pernas, dribles, fortes emoções...

http://mais.uol.com.br/view/236410

De maneira brilhante e revolucionária o autor criou uma nova linguagem e forma de mostrar um jogo de futebol colocando 5 câmeras dentro do estádio, pois somente assim, seria capaz de registrar todos os movimentos e dribles desconcertantes e seus belos gols.

http://www.youtube.com/watch?v=7Myviztka3M

Todos estes elementos, na verdade, são colocados com o objetivo de documentar a alegria do povo em torno do futebol, que teve em Mané Garrincha um dos seus maiores expoentes. As reações das pessoas à presença de Garrincha nas ruas, dos torcedores acompanhando as jogadas são bastante fortes, e significativas.. Tais cenas têm seu apogeu em 62 quando Garrincha volta ao Brasil com a taça de Bi-Campeão Mundial, título do qual ele é o maior responsável pela conquista, já que o Rei Pelé se machucou ainda na primeira fase.

Porém o filme não lida somente de alegria, e sim de emoções que o futebol provoca. Para tanto o autor não poderia deixar de lado o pior episódio a história do futebol nacional – a derrota na copa de 50 para o Uruguai em pleno Maracanã – toda a tristeza e frustração dos Brasileiros diante daquela situação. A cena mais marcante dessa parte do filme é ver o maior estádio do mundo, construído especialmente para essa Copa do Mundo vazio e com um fúnebre silêncio após a derrota. Intrigante!

Ao final, de forma inconclusiva, e numa tentativa de explicar o que leva àquelas fortes emoções, o autor lança duas possíveis “teorias”. Por uma, a bola, e seu formato redondo, nos remeteriam às primeiras emoções relacionadas ao ventre materno. Assim, acompanharíamos as jogadas, subliminarmente nos remetendo aos primeiros e básicos sentimentos humanos.

O outro possível fundamento para a causa da importância do futebol seria baseado na necessidade de “exorcizar” nossas frustrações diárias. Assim, semanalmente assistiríamos às partidas de futebol para descarregar nossas emoções e frustrações, restabelecendo a necessária alegria para enfrentar o triste cotidiano."

Garrincha, Alegria do Povo

(Garrincha, Alegria do Povo, 1962)

• Direção: Joaquim Pedro de Andrade
• Roteiro: Luiz Carlos Barreto, Mário Carneiro, Joaquim Pedro de Andrade, David Neves, Armando Nogueira
• Gênero: Documentário
• Origem: Brasil
• Duração: 60 minutos
• Tipo: Longa-metragem

terça-feira, 14 de dezembro de 2010


Festim Diabólico - Alfred Hitchcock.

por Marlon Marques.

























Os mais desavisados podem pensar que o filme trata de um sabá de bruxas – uma festa diabólica, mas não é desse diabolismo que o título se refere. O título original é Rope (Transatlantic Records, 1948) – em inglês corda – pois David, um dos personagens, é estrangulado com uma corda por dois jovens intelectuais. O traço macabro que perpassa boa parte da obra de Hitchcock, se dá nesse filme, pelo fato desses dois jovens ocultarem o cadáver em uma urna e depois fazer dela uma mesa de jantar em uma festa. Daí o título em português. O filme começa mostrando uma avenida, onde a vida corre em seu curso normal, pessoas indo ao trabalho, crianças indo à escola, pessoas indo e vindo de e para algum lugar. Com a câmera no parapeito de um edifício, lentamente a transição é feita, trazendo ao plano a janela e ai se dá o primeiro corte. No interior do apartamento – onde brilhantemente Hitchcock desenvolve como uma espiral toda a sua complexa trama – David é assassinado por Brandon e Phillip. Os debates em torno dos motivos do crime são muitos – cada um com o seu repertório pessoal aponta supostos fatores, caindo quase que como um consenso na psicopatia. Brando até pode ter traços de psicopatia, mas Philip nenhum. O que talvez me fique mais evidente, é o desnudamento da personalidade humana, justamente aquela que extrapola o gênero (homem/mulher). Para o crítico Carlos Armando, os filmes de Hitchcock, “falam do complexo e da transferência de culpa, da dupla personalidade, da troca de identidades”, e isso não é algo exclusivo de um sexo ou de outro – mas sim, do ser humano[1]. O filme traz também outra questão de fundo: a moral. E para isso, Hitchcock se aproxima da fórmula binária de Lévi-Strauss. Primeiro ele já nos mostra as diferenças de Philip e Brandon – o primeiro é mais inseguro e fraco, enquanto o segundo é confiante e forte. Depois (já na festa), ele nos mostra de um lado os dois jovens e do outro os convidados – onde os primeiros representam a superação da moral cristã (Nietzsche), e os segundos a tradição moral ocidental. Se repararmos bem, o professor Rupert entra na trama como um intermediário, como um elemento distinto dos dois grupos, apesar de ser o mentor intelectual dos jovens. A trama é desenvolvida de uma forma muito prática, o que mostra a genialidade de Hitchcock a despeito de todas as dificuldades técnicas a ele impostas. Como Rope é uma obra oriunda do teatro, Hitchcock teve que se utilizar desses recursos para nos dar a exata noção de tempo continuo. Para isso também, o diretor teve o cuidado de usar a sala principal do apartamento como centro da trama, pois nela há uma imensa janela, onde o tempo todo nos deparamos com as mudanças de tonalidade do céu (isso seria impossível no cinema preto e branco) – evidenciando a passagem do tempo. O público é atraído pela trama não apenas pelo enredo bem estruturado do roteiro, mas pela caracterização teatral, que traz em si uma proximidade maior, e também pelo fato de Hitchcock a toda hora nos dizer que isso acontece o tempo todo em nossas vidas e que é justamente assim que agimos. Quem confessa um erro no instante seguinte? Ninguém. Todos nós escondemos, omitimos, mentimos, trapaceamos, então vendo tudo isso na trama, nos sentimos nela – e é isso que cria a tensão. Nós expectadores sabemos que o corpo está na urna – perversamente, Hitchcock numa cena, põe a urna no primeiro plano e a porta no plano de fundo – a empregada sra. Wilson ao fazer a arrumação pós-jantar a toda hora parece que vai abri-la e revelar o cadáver, isso vai provocando agonia no expectador – você logo associa com a descoberta de algum erro seu, mas na verdade ali é Brandon e Philip e não você, mas você se vê neles. Em outro momento, o professor Rupert ao indagar Philip sobre se David havia passado pelo apartamento, percebe a mentira não apenas em sua fragilidade e aparente nervosismo, mas numa pista que Hitchcock nos dá – Rupert vai pegar seu chapéu no armário, mas se confunde e pega um outro – nesse momento a câmera dá um close nas mãos de Rupert e nos mostra no interior do chapéu a sigla “D.K.”, David Kentley – ou seja, o mesmo passara por ali e esquecera seu chapéu. É o que Bazin sentenciou quando disse: “a cristalização passageira de uma realidade cuja presença nos arredores é sempre sentida” – Hitchcock desmente Brandon e a nós, dizendo que não há crime perfeito, que sempre haverá evidências.[2] Rupert com sua experiência vai colocando os jovens na parede, especialmente o mais fraco deles, Philip, que aos poucos vai cedendo, num misto de fragilidade e embriaguez. Philip a meu ver é a primeira vítima da moral, pois passa o filme todo atormentado pela culpa. Já Brandon não, esse vê o crime como “uma obra prima intelectual” – coroando a superioridade do super-homem ante aos homens[3]. A segunda vítima da moral é o professor Rupert – que ao longo da trama vai percebendo os elementos discursivos de Brandon – na cena da conversa coletiva (todos os convidados), onde Brandon com seu ar superior diz que não vê os homicídios como coisas ruins, principalmente quando o assassinado é um ser inferior. No final do filme há o embate entre Rupert e Brandon, onde o primeiro se espanta com a interpretação do segundo sobre os ensinamentos de filosofia. Rupert diz: “você pensa que é Deus para determinar quem deve ou não morrer e apontar as pessoas como inferiores” – nota-se nessa fala, indignação, mas o desapontamento se dá quando ele cai em si e vê que seus ensinamentos foram deturpados e que indiretamente fora responsável pelo crime. “Aquele que vê o crime no lugar em que está é responsável por ele, o verdadeiro culpado é aquele que sabe o que o crime quer dizer” – isso compartilha a culpa entre os três, Philip, Brandon e Rupert.[4] Rupert não imaginava que suas palavras fossem capazes de gerar tal atrocidade, mas a arrogância de Brandon (grande interpretação de John Dall) e sua apreensão literal da teoria nietzschiana, o levou ao extremo. Brandon não suportava o fato de as pessoas guiarem suas vidas pela fé ou pela moral, pois considerava apenas o intelecto como único guia capaz de chegar à verdadeira razão – sobre isso disse Nietzsche: “a maior parte das pessoas não acha desprezível acreditar nisto ou naquilo e agir de acordo sem ter pesado pró e o contra, sem ter consciência profunda das suas supremas razões de agir, sem mesmo de ter incomodado a inquirir essas razões, os homens mais dotados e as mulheres mais nobres também fazem parte desse grande número. Que me importam bondade, finura e gênio, se o homem que possui essas virtudes tolera no seu coração a mornice da fé, do juízo, se a exigência da certeza não é o seu mais profundo desejo, a sua mais íntima necessidade”.[5] O grande mérito de Festim Diabólico é contar uma trama complexa de uma forma simples, didática – como na cena em que Rupert descreve o crime e a câmera acompanha a descrição, e envolver o expectador de uma tal maneira, onde esse torna-se parte da narrativa e sofre com o sofrimento dos personagens.



[1] ARMANDO, Carlos. A sala dos sonhos. Belo Horizonte: C/Arte editora, 1999. p. 164.

[2] BAZIN, André. O Cinema – ensaios. São Paulo: Brasiliense, 1985. p. 136.

[3] FRUNDT, Bodo. Alfred Hitchcock e seus filmes. Rio de Janeiro: Ediouro, 1992. p. 115.

[4] VEILLON, Olivier-René. O cinema americano dos anos cinqüenta. São Paulo: Martins Fontes, 1993. p. 110.

[5] NIETZSCHE, Friedrich. A Gaia Ciência. São Paulo: Martin Claret, 2003. p. 37.



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segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

A Marca da Maldade por Bárbara Borges

A marca da maldade
Quando a dualidade humana vem à tona


“Tudo isso confirma exatamente o propósito de Orson Welles: aos medíocres as provas, aos outros a intuição.”
(François Truffaut, 1958)

“Parece-me enfim que A marca da maldade confirma uma ideia [...]: filmado por um diretor inspirado o thriller mais ordinário pode se tornar o mais emocionante fairy tale.”
(François Truffaut, 1998)



Cineasta e ator estadunidense, Orson Welles (1915-1985) iniciou sua carreira no teatro e estreou no cinema de longa-metragem com o filme Cidadão Kane (1941), em que atuou, produziu, roteirizou e dirigiu. Depois de afastar-se de Hollywood, reestreou com A marca da maldade (1958), uma importante obra que, segundo François Truffaut, assim como os demais filmes do “monstro” Welles, mostra o caráter feérico do diretor.

Baseado no romance policial Badge of evil (1956), de Whit Masterson (Robert Allison Wade e H. Bill Miller), o filme A marca da maldade apresenta um policial corrupto, que se gaba por sua intuição apurada, quando na verdade aproveita as falhas do sistema judiciário americano para forjar provas que comprovem sua interpretação dos fatos, não se importando com a acusação de inocentes.

A sua forma de “fazer justiça” aproveitando-se da mediocridade de seus colegas de trabalho, como o sargento Pete Menzies (Joseph Calleia) sempre foi bem-sucedida até que, na resolução de um crime – a morte do casal ocupante de um carro após a explosão de uma bomba-relógio na cena inicial do filme –, depara-se com um policial mexicano que desconfia de seus métodos de investigação, papel de Charlton Heston.

Cenas iniciais, com destaque para o plano-sequência

Estamos diante de um embate maniqueísta que tomará conta do filme, em que o inspetor Hank Quinlan (Welles) utilizará seus métodos para tirar Ramón Miguel Vargas (Heston) de seu caminho – como o rapto da senhora Susan Vargas (Janet Leigh) –, enquanto o policial mexicano buscará as provas necessárias para desmascará-lo. Como apontou Truffaut, é um confronto entre um monstro e um galã simpático.

Entretanto, esse maniqueísmo não deve ser levado ao pé da letra, especialmente quando analisamos Quinlan, um personagem extremamente complexo que, frágil diante do alcoolismo e impotente diante do assassinato de sua mulher, demonstrará as fraquezas humanas, as quais, desde então, tentará superar com a ideia de fazer justiça a qualquer preço, quer dizer, justiça de acordo com o seu ponto de vista.

O embate entre Vargas e Quinlan

Em um filme noir, desprovido da femme fatale entre outros aspectos, porém sem prejuízo para o ótimo resultado alcançado pela construção dos personagens, Welles empreende uma crítica ao mundo onde as virtudes valorizadas são difíceis de serem alcançadas e perdem espaço para os vícios que, no senso comum, deveriam ser evitados, mostrando como ambos são intrínsecos ao ser humano, que de adapta às situações.

Para Truffaut: “O espírito do filme está muito bem resumido no epílogo: a delação e a mediocridade triunfaram da intuição e da justiça absoluta. O mundo é pavorosamente relativo, aproximativo e desonesto na prática de sua moral, impuro em sua equidade”. Assim, imoralidade, amoralidade, moralidade passam pelos olhos do diretor sem preconceitos, o que não impede a emissão de juízos de valor por parte do espectador.

Enquanto em frente às câmeras o diretor critica as pessoas que não assumem o que de fato são, nos bastidores, ele não entra em acordo com seus produtores que não o entendem e o demitem durante a pós-produção do filme, depois de vetarem sua edição, desconsiderando suas indicações. Somente em 1998, o desejo de Welles foi atendido, com o lançamento da nova montagem do filme lançada pela Universal.

Trailer (1998)
http://www.youtube.com/watch?v=NkUv1xFnJ6Q)

Filme sob encomenda com roteiro reescrito em oito dias e filmado em cinco semanas, A marca da maldade é uma obra renegada pelo diretor, mas, além de contar com a sempre bem-vinda atuação do ator Welles, não deixa de carregar muitas das características do cineasta Welles. Analogamente ao filme, embora a mediocridade tenha prevalecido, ela não anulou a intuição, não ofuscou a genialidade do homem George Orson Welles.
A marca da maldade
(Touch of evil, 1958)

Direção: Orson Welles
Roteiro: Whit Masterson, Orson Welles
Gênero: Drama/policial
Origem: Estados Unidos
Duração: 95 minutos





Para saber mais

BAZIN, André. Orson Welles. Tradução de André Telles. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006.

MASTERSON, Whit. A marca da maldade. Tradução de Luís Antônio Aguiar. Rio de Janeiro: Ediouro, 2000. (Suspense Legal.)

TRUFFAUT, François. A marca da maldade (Touch of evil). In: ______. Os filmes de minha vida. Tradução de Vera Adami. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989. p. 320-323.